A advocacia enfrenta desafios, como o grande número de profissionais recém-formados, e mantém a atração para os que querem entrar na carreira pública ou disputar vagas em escritórios
Desembargador, juiz, promotor de Justiça, delegado, tabelião – todas essas carreiras têm o Direito e a profissão de advogado como base. As possibilidades no serviço público são as mais diversas e, somados a estabilidade e bons salários, os concursos se tornaram um dos principais atrativos dos estudantes de Direito nos últimos anos. A realidade do mercado de trabalho, no entanto, é bem mais diversa e impõe aos interessados na advocacia a necessidade de traçar estratégias de sobrevivência. Também pudera, somente em Londrina existem 11 cursos de Direito e, por ano, mil novos bacharéis se formam, destes 700 concluem os trâmites e ingressam na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). A concorrência é grande e as oportunidades estão relacionadas com o empenho de cada um. Conquistar uma vaga em um grande escritório de advocacia depende do empenho individual. “Muitas vezes recebo currículos de profissionais com pós-graduação, mestrado e doutorado, mas pouco sabem sobre as necessidades do escritório ou não estão atualizados quanto aos temas da nossa atuação. Então, esses profissionais não servem. Me interesso por quem sabe como e onde atuamos, de quais causas participamos. É preciso conhecer o trabalho de onde se quer trabalhar”, avalia Gustavo Rezende Mitne, 32, sócio do Balera, Berbel e Mitne, escritório especializado em Direito Tributário.
Para Mitne, o sucesso profissional está ligado diretamente à ambição e às oportunidades, assim como os ganhos podem ser muito mais vantajosos para quem prefere se arriscar na carreira da advocacia. Seu conselho é que ouça menos quem aposta na estabilidade. “Os pais tendem a querer que os filhos façam aquilo que permitam ter maior segurança, mas isso não necessariamente traz felicidade e realização pessoal. O fundamental é ver o que o mercado aponta. Quais são as áreas que demandam mais profissionais. O volume de atualização do advogado hoje é absurdo e os jovens têm uma maior capacidade de absorver as transformações”, explica o advogado. Os números comprovam: de 2006 a 2016, o Brasil teve 33 novas leis complementares, 464 medidas provisórias, 2093 leis e 3.221 decretos presidenciais. Neste período, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) editou 603 normas diferentes; a Receita Federal, 1209; e o Banco Central, 18.433. Sem contar o novo Código de Processo Civil, a criação das leis Maria da Penha e de Biossegurança, além da recente reforma Trabalhista. Também há as novidades das normas nos âmbitos estaduais e municipais.
Outro dado que inegavelmente chama atenção é a movimentação jurídica causada pelas operações e investigações capitaneadas pela Polícia Federal e o Ministério Público, especialmente no Paraná, com a Lava Jato. Reconhecido por sua atuação, em especial na área criminal, o londrinense Anderson Mariano aponta que mesmo o novo cenário se tornou um desafio para os próprios advogados. “Hoje em dia é muito mais difícil obter resultado, mas a demanda é grande. E todo mundo está sujeito a precisar de um advogado. Mesmo os advogados, às vezes, precisam de advogado. É importante consultar um profissional, sempre que tiver dúvida em relação a um problema”, afirma Mariano. Em sua opinião, o direito penal econômico, o direito tributário e o compliance são os que apontam um crescimento. “Nunca as empresas precisaram tanto da advocacia. O compliance é uma consultoria que ajuda a empresa a evitar riscos, exposição e problemas com a Justiça, assim como atende também a pessoas físicas”, explica.
Momento complicado
A OAB entende que o momento para a profissão é complicado, especialmente pelo grande número de cursos de Direito ofertados no País. O assunto, inclusive, foi tema do Fórum Nacional de Educação Jurídica, em setembro. Números apurados pela Comissão Nacional da OAB apontam o surgimento de 201 novos cursos de Direito em 2018, com quase 30 mil novas vagas ofertadas. Desse total, 32 novos cursos surgiram na Região Sul do Brasil, metade deles no Paraná. “A verdade é que muitos jovens saem das universidades e não encontram mercado de trabalho. Em Londrina mesmo há a possibilidade de surgir mais um novo curso. A saída fundamental para quem está começando é buscar se especializar em novas áreas. Há o Direito Digital e o Direito Sistêmico, que estão em pleno crescimento e muitos profissionais mais velhos acabam por não estar prontos para atuar”, explica Vânia Queiroz, presidente da OAB Londrina. Segundo dados da pesquisa realizada pela Selem, Bertozzi & Consultores Associados, em 2018, o Brasil atingiu a marca de 1 milhão de advogados. Já o número de instituições que lecionam Direito no país são de aproximadamente 1.120, um número maior do que em países como Estados Unidos, China, Alemanha, Itália e França.
Independentemente das dificuldades do mercado de trabalho, que no Brasil são muitas, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o desemprego recuou em novembro, para 11,6%. Mas, mesmo assim, atinge 2,2 milhões de pessoas. Para sobreviver em meio a tanta instabilidade, é preciso apostar nas próprias qualidades e estar atento ao que é esperado pelo mercado. É redundante afirmar a necessidade de ter boa oratória e capacidade de comunicação, inteligência emocional e saber trabalhar em equipe. ” O direito depende muito da escrita, além disso, o profissional precisa ser criativo e ter boa dinâmica. Para trabalhar nesse meio, a pessoa precisa mostrar uma visão maior de mundo e fugir do simplismo. Advogado tem que ter responsabilidade, sem isso fica muito difícil crescer”, conclui Mariano.